A problemática das tendências que valorizam a extrema magreza acima de tudo (inclusive da saúde) - newsletter #08
Ozempic, trend "magras, magras, magras" e shape slim. O que essas tendências têm em comum?
São tendências valorizam a magreza acima de tudo - inclusive da saúde - fazendo com que pessoas engajem em atividades que podem trazer prejuízos para a saúde física e mental ao tentarem se encaixar nos padrões estéticos.
Na contramão da promoção da saúde, essas tendências não melhoram a relação com a comida, com o corpo e com os exercícios físicos - que s˜åo elementos chave para a manutenção de um estilo de vida verdadeiramente saudável - e, na grande maioria das vezes, causam efeito rebote.
Trend "Magras, magras, magras"
Essa é uma trend/meme do tiktok onde pessoas comemoram doenças, como uma intoxicação alimentar, pois acham que resultarão em emagrecimento.
Qual o problema?
A problemática com a trend é que normaliza comportamentos transtornados com relação a comida, como: necessidade de compensar o que comeu através de métodos inapropriados, "malhar" para poder comer e até o fato de comemorarem doenças visando o emagrecimento.
Trend do "Shape SLIM"
Tal qual as revistas teen dos anos 2000, existe uma tendência onde influenciadoras ensinam como alcançar um "shape slim" através de determinados exercícios físicos e dietas rigorosas, como se fosse apenas uma questão de força de vontade, ou algo a ser seguido com garantia de resultados, como uma receita de bolo!
Qual o problema disso?
Não existem evidências científicas de que estratégias de perda de peso intencionais que sejam sustentáveis a médio e longo prazo, e as consequências das dietas rigorosas para a saúde são inúmeras, como:
maior risco para o desenvolvimento de transtornos alimentares;
maiores chances de comer compulsivamente;
diminuição do metabolismo;
efeito sanfona (perigoso para a saúde cardiovascular);
Diminuição da percepção de fome e saciedade.
Além disso, naturalmente, existem biotipos diferentes. Mesmo que todos façam a mesma dieta e se exercitem da mesma maneira, ainda existirá diversidade de corpos.
Resultados não podem ser generalizados pois variam de pessoa para pessoa e, para muitas pessoas, alguns deles só são alcançados com cirurgias plásticas.
Trend do uso indiscriminado do Ozempic para o emagrecimento
Medicamentos como Ozempic, Wegovy (semaglutida) e Mounjaro (tirzepatida) são injeções (bem caras) que vêm sendo aclamadas como milagres, já que podem levar algumas pessoas ao emagrecimento.
A promessa de escapar do estigma do peso e atender aos padrões estéticos da nossa cultura é sedutora. É compreensível por que pessoas em corpos maiores — ou qualquer pessoa que se sinta inadequada, ou "gorda demais" — são atraídas por esses medicamentos milagrosos.
O marketing do Ozempic se aproveita disso e explora a vulnerabilidade das pessoas!
Recentemente, tive o desprazer de me deparar com uma propaganda de Ozempic na TV americana, na qual é feita uma paródia da letra da música "Magic" da banda Pilot, mudando a palavra "Magic" para "Ozempic", ou seja, o próprio marketing do medicamento apela para uma conotação de mágica, milagre!
Qual o problema do uso indiscriminado do Ozempic para o emagrecimento?
A perda de peso só pode ser mantida enquanto o paciente fizer o uso desses medicamentos e geralmente as pessoas recuperam o peso perdido rapidamente quando param;
Efeitos colaterais vão desde náuseas e vômitos, cólicas estomacais, diarreia, inchaço, gases. Mesmo na ausência de sintomas gastrointestinais, um estudo descobriu que mais de 17% dos pacientes que tomam essa classe de medicamentos desenvolveram massas de alimentos não digeridos ou parcialmente digeridos em seus tratos gastrointestinais, colocando-os em risco de obstruções gastrointestinais. Outros efeitos colaterais documentados em ensaios clínicos incluem: pancreatite, doença da vesícula biliar e danos renais
Medicamentos não tratam a raiz do problema: o comportamento alimentar, manutenção de hábitos saudáveis, uma boa relação com a imagem corporal e exercícios físicos.
SE DÊ CONTA!
Nosso peso é determinado por uma série de fatores, como: genética, saúde mental, uso de medicamentos específicos, horas de sono, qualidade alimentar, exercícios físicos, histórico de dietas, entre muitas outras coisas.
Por maior que seja a nossa "força de vontade" , ou por mais que tenhamos acesso ao medicamento emagrecedor mais milagroso do mundo, é difícil conseguirmos hackear algumas questões biológicas.
"Tentar reduzir o peso a 'comer menos e se exercitar mais' , ou utilizar medicamentos é como tentar consertar um carro quebrado apenas colocando gasolina."
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Para saber mais, compre meu livro:
Referências:
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